terça-feira, março 27, 2007

Há dias ele não atendia mais o celular. Há tempos ele não respondia scraps no orkut e nem entrava no msn. Fazia muito tempo mesmo que ele não ligava pra nenhum familiar, mas eles também não ligavam. Desistiu do emprego, fez compras e se trancou no apartamento.
Não limpava nada, não atendia ninguém, não ligava seu playstation. Não fazia nada.
Cleide veio limpar o apartamento um dia, ele nem antedeu o interfone.
No dia seguinte a polícia veio, pensando que ele estava morto. Abriu a porta e provou que não estava. Eles saíram enjoados com o cheiro de podre que vinha da escuridão do imundo apartamento.
Tinha definhado, estava muito doente e tossia o dia todo. Talvez a culpa fosse dos vinte cigarros diarios, às vezes vinte e cinco, às vezes trinta. Variava.
Passava os dias olhando o espelho com uma resposta na ponta da lingua. Mas a pergunta, que poderia partir de qualquer um dos lados, nunca vinha.
De vez em quando coçava a barriga, de vez em quando cheirava o suvaco, mas sempre se arrependia.
Dormia debaixo da mesa do jantar e usava a banheira como banheiro.
Prometeu nunca mais tocar em ninguém, mas toda vez que se lembrava sentia enjôo e repulsa por si mesmo. O remorso o corroía.

"O ser humano é solitário por natureza. O ser humano é imundo por natureza. Nossos vícios nos dominam. Nossas paranóias se revelam. Nossas taras nos consomem."

Numa manhã nublada de quinta-feira, olhando pro espelho ouviu seu reflexo dizer: "Você não está prestando atenção."
Se jogou do 13º andar depois do 44º dia.






Peço desculpas aos poucos visitantes dessa página pela ausência de periodicidade nas minhas postagens. Peço desculpas também pela falta de educação que é postar um texto desses. Prometo me dedicar um pouco mais ao blog, mas os dias me parecem cada vez mais curtos.
Abraços.